quarta-feira, 22 de agosto de 2007


Anistia Para os Amores Fora da Lei
“FAÇA COMO OS AMANTES LIVRES, ASSUMIDOS,
AQUELES ANISTIAM-SE A SI MESMO E AOS OUTROS”.

Se a tarde existe para ser amada, como quer Sérgio Milliet, ou queria, para quem acredita na morte de um grande escritor, então amemos a tarde. E de tal modo, que não reste nada de amor jogado fora, pois todo amor deve ser investido de uma vez, posto que é um perigo se amar pela metade.
Acontece que nem todas as tardes são iguais, e por isso ninguém pode amar as tardes indistintamente, como se todas fossem sensuais e irresistíveis, é preciso amar a tarde com um mínimo de critério, como se ama um amante a cada encontro proibido, com um certo sabor de clandestinidade.
E uma tarde amável dessas dei de cara com a inscrição de uma camiseta de Venâncio, poeta do Beco, que dizia assim, no peito da moça cheia de graça: anistia para os amores ilegais. Olhei bem o aviso, medi a intensidade de sua verdade muda sobre o peito e pensei na grande campanha que este país nos deve.
Não diga a mim, pessoalmente, que na verdade não tenho amores ilegais. Digo nos deve porque deve a todos e porque, sinceramente, se há uma anistia necessária é essa dos amores ilegais. Resta saber, nesse exercício de constitucionalidade amorosa, a quem cabe, afinal, anistiar um amor ilegal.
Se é á justiça, tanto pior. Dizem que é cega e assim já fica muito difícil anistiar amores ilegais sem poder julgar de olhos abertos. Bem abertos, parciais e passionais, com toda a força de anistiar mesmo diante do perigo de ser acusada de um julgamento, digamos, tendencioso. Todo amor tem tendências.
Na verdade, o amor deve ser anistiado principalmente por quem o proíbe. O proibidor, sim, deve ser o primeiro a anistiar. Se não há mais solução, se o amor dito ilegal deu certo paciência, legal é o amor desejado. Legal porque baseado na lei do desejo e amor sem desejo é expediente matrimonial.
Claro que fica muito difícil ao homem, principalmente ao homem, esse pobre e ingênuo animal de estimação, coragem de anistiar o amor ilegal de sua mulher, convenhamos, amada. Mas, ora, meu caro, é preciso ter coragem. Do contrário você vai terminar arrastado pela ilegalidade de sua vã proibição.
Quanto às mulheres, tanto pior. Possessivas e estranhas, as mulheres também precisam anistiar, ao invés da que briga e diz, num ímpeto mentiroso: vou lutar e segurar meu marido. Não, não faça besteira. Veja quantos homens tentaram segurar suas mulheres e quantos foram bobos. E como foram inúteis.
Faça como os amantes livres, assumidos, aqueles anistiam-se a si mesmos e ao outros. Largue essa mania de dividir o que não é divisível e assuma de frente. E aproveite os conselhos que deixo aqui, num lapso de babaquice que me dou, de vez em quando, o luxo de praticar. Faça a sua anistia, de você mesmo inclusive, antes que isso aqui vire consultório sentimental. Beijos, abraços e até amanhã.

(Vicente Serejo – O POTI)

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